Islamitas saem às ruas do Cairo em resposta ao golpe que tirou Mursi do poder


Publicado Por: Agência Efe
Antonio Pita.

Cairo, 5 jul (EFE).- Os simpatizantes do deposto presidente egípcio, Mohammed Mursi, saíram às ruas do Cairo nesta sexta-feira para protestar contra o golpe militar que o derrubou na última quarta, em uma manifestação que começou pacífica e terminou com confrontos contra partidários das novas autoridades na praça Tahrir.

Após dois dias de clima de vitória dos grupos da oposição, em função do golpe de Estado que tirou Mursi do poder, os simpatizantes do

presidente deposto saíram hoje em massa às ruas do Cairo, prometendo não sair das praças até sua volta.

Dezenas de milhares de pessoas, em grande maioria homens (muitos deles com as espessas barbas próprias dos islamitas), se reuniram após a reza do meio-dia na praça Rabea al Adauiya, no leste da cidade.

Ao ambiente pacífico predominante durante o dia seguiram enfrentamentos no começo da noite na praça Tahrir, assim como no Delta do Nilo, que causaram cinco mortes e deixaram mais de 200 pessoas feridas.

Os islamitas tentaram entrar na praça Tahrir e foram impedidos pelos críticos de Mursi e desviados em direção à ponte Seis de Outubro, onde houve confronto. Segundo a agência estatal de notícias "Mena", os islamitas queimaram um veículo no meio da ponte.

As Forças Armadas advertiram hoje em comunicado contra qualquer "provocação ou ataque" à manifestantes pacíficos e afirmaram que quem descumprir esta norma será tratado com "firmeza".

Ao contrário do ambiente festivo dos últimos dias na praça Tahrir, epicentro dos partidários do golpe, a praça Rabea al Adauiya foi hoje palco de indignação.

"O exército tem as armas, mas não o coração dos egípcios. Quando laicos e liberais tomam o poder, transformam o país em uma ditadura", lamentou Diad Siasi, ator de 45 anos.

A seu lado, com um Corão na mão, túnica branca e uma espessa barba, Khaled Hashim confiava que Mursi voltará ao poder graças aos "protestos pacíficos" e a "muita paciência".

"Nossas armas são duas: nossa presença aqui e a bênção de Deus", sentenciou no coração da praça, onde há uma mesquita com fotos de Mursi e bandeiras egípcias, assim como um palco no qual apareceu o líder da Irmandade Muçulmana, Mohammed Badía, que era dado como detido.

Enquanto isso, dois dirigentes da formação detidos pela procuradoria geral, o presidente do braço político, Saed al Katatni (que foi acusado de instigar o assassinato de manifestantes) e o guia espiritual, Rachad Bayumi, eram libertados por falta de provas.

O anúncio da presença de Badía gerou um clamor entre os presentes, com gritos de "Sisi (chefe do exército) vá embora, Mursi é nosso presidente" e "Alá é grande".

Badía disse que as manifestações continuarão até que o exército devolva o cargo ao vencedor das primeiras eleições presidenciais em 2012, após a queda de Hosni Mubarak um ano antes.

"Permaneceremos em todas as praças até restituírem o nosso presidente", clamou o guia espiritual da Irmandade Muçulmana, que disse que seu grupo reconhecerá apenas a legitimidade de Mursi e das instituições eleitas democraticamente.

"Sacrificaremos nossas almas por Mursi (...) Com nossos peitos abertos, somos mais fortes que as balas", destacou Badía diante dos manifestantes, que foram aumentando de número com a passagem das horas.

A multidão respondeu inflamada pouco depois da aparente provocação do exército, que enviou um helicóptero para sobrevoar a praça a pouca altura e uma formação de aviões, que desenharam a bandeira egípcia com sinais de fumaça.

Na guerra paralela pelas palavras e símbolos que mantêm partidários e opositores do golpe, os manifestantes gritavam ao helicóptero "Irhal" ("vá embora"), lema dos grandes protestos contra Mursi, e mostravam cartazes verdes (cor do Islã).

As mulheres, grande parte delas com "niqab" (véu que deixa apenas os olhos descobertos), estavam separadas dos homens, alguns dos quais liam o Corão, sussurravam concentrados as fontes do islã ou presenteavam tâmaras e "kushari", a barata comida nacional.

Nos arredores da praça, onde não havia polícia, grupos de jovens barbudos, armados com canos ou pedaços de pau, controlavam os acessos em uma fila tripla: uma para pedir a documentação, outra para fazer a revista e uma terceira para registrar as bolsas.

No centro do Cairo, na praça Tahrir, ainda seguem concentrados centenas de egípcios em apoio ao novo presidente interino, Adly Mansour, que em sua primeira declaração constitucional dissolveu hoje a câmara alta, dominada pelos islamitas.

Neste contexto, o grupo salafista Gama Islamiya, aliado do presidente deposto, reivindicou hoje um plebiscito para acabar com a discórdia, no qual os egípcios decidam entre o plano imposto pelo exército ou o retorno de Mursi ao poder.

À crise política somou-se hoje uma frente militar, com a decisão do exército de decretar o estado de emergência no sul do Sinai e na província de Suez, depois que grupos armados atacaram postos de controle no norte da península, informou a televisão estatal. EFE

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