Você é um ouvinte apagado e chato?



O ouvinte ativo e interessante é aquele que além de ouvir atentamente, mostra que está ouvindo, elabora o que ouviu, mostra suas reações ao que ouviu e ajuda o falante a gerenciar o que está dizendo. Este artigo vai examinar os fatores que diferenciam um ouvinte apagado e chato de um ouvinte ativo e interessante.
Madelyn Burley-Allen no seu livro  “Listening: The Forgotten Skill: A Self-Teaching Guide” (John Wiley & Sons, 1995), classifica os graus de escutar e ouvir em quatro níveis:
Nível 1 - Escutar básico: ser capaz de escutar os sons da fala do interlocutor.
Nível 2 - Escutar pleno: ser capaz identificar palavras/frases que foram ditas sem entender seus significados.
Nível 3 - Ouvir básico: entender o que ouviu (por exemplo, ser capaz de repetir em outras palavras o que foi dito).
Nível 4 - Ouvir pleno - ser afetado pelo que foi dito (ficar emocionado, mudar o curso de ação, passar a pensar de outra forma, etc.)
Ouvir é diferente de mostrar que está ouvindo
"Você ouviu o que eu disse? Então repita!" Ouvir e mostrar que está ouvindo são duas coisas distintas, embora relacionadas. Uma pessoa pode ouvir a outra sem mostrar nenhum sinal que está fazendo isso. Por exemplo, ela pode estar ouvindo através de um microfone oculto, fingir que está dormindo, estar escondida ou pode estar atrás de quem está falando, como fazia Freud, enquanto ouve tudo o que está sendo dito. O contrário também é possível: uma pessoa pode mostrar sinais que está entendendo o que está sendo dito quando, de fato, não está entendo nada. Isto ocorre, por exemplo, quando o ouvinte orienta a frente do seu corpo na direção do falante, inclina o tronco na sua direção e anui com a cabeça quando este faz pausas ou produz certas inflexões na voz, tudo isso sem ouvir nada do que está sendo dito

Mostrar que está ouvindo: o ouvinte ativo

Para ser um bom ouvinte não basta captar as mensagens do falante. É preciso ser ativo e mostrar que está captando-as, entendendo-as e como está reagindo a elas. Também é necessário ajudar o falante a gerenciar aquilo que ele está apresentando. Para isso, o ouvinte deve apresentar mensagens do tipo fale mais, fale menos, apresente mais detalhe, explique melhor e informar o falante sobre os efeitos que a sua comunicação está provocando nele (interesse, espanto, revolta, etc.).  Todas as ações ou inações do ouvinte que acontecem após uma comunicação  apresentada pelo seu interlocutor são indicativas de que ele recebeu tal comunicação e do como reagiu a ela.

A comunicação não-verbal do ouvinte ativo

A lista abaixo apresenta os principais comportamentos não-verbais que são apresentados por um ouvinte ativo.
- Mostrar sinais que está disponível para conversar.
Por exemplo, dizer que está com tempo livre; encostar-se em uma superfície convidar para sentar; interromper claramente o que estava fazendo (desligar a tevê, desligar o computador); colocar a pasta sobre a mesa; fechar a porta para evitar interrupções; pedir para secretária não interromper.
- Assumir uma distância propícia para conversar. Não ficar nem muito longe nem muito perto do seu interlocutor. Quando ambos estão em pé, deixar o interlocutor estabelecer a sua distância preferida. Depois que ele fizer isso, caso você queira “esquentar” um pouco o relacionamento, se aproxime dele mais um pouquinho (puxe a sua cadeira para mais perto ou dê um passinho na sua direção, mas não exagere).
- Evitar barreiras físicas. Barreira é a presença de um obstáculo entre os interlocutores. Existem dois tipos de barreiras: (1) corporal. Por exemplo, as pernas cruzadas de um interlocutor são interpostas entre ele e o outro; (2) objeto: os interlocutores ficam separados por uma mesa um balcão. É comum colocar uma pasta ou bolsa entre si e outra pessoa quando ambas sentam-se em um mesmo sofá. Também é comum segurar uma pasta ou uma bolsa contra o peito, deixando-a entre si e outra pessoa.
- Assumir posições semelhantes as do interlocutor. Por exemplo, os dois interlocutores permanecem sentados ou em pé ou encostados em uma parede. É importante manter os olhos na mesma altura dos olhos do interlocutor. Assumir posições diferentes daquela adotada pelo interlocutor contribui para quebrar o clima positivo da conversa.
- Orientar a frente do corpo na direção do interlocutor. Voltar toda a frente do seu corpo (rosto, peito, púbis, joelhos e pés) na direção do interlocutor. Caso isso fique desconfortável devido ao excesso de intimidade, diminua um pouco esta orientação.
- Anuir frequentemente com movimentos de cabeça. Este é um dos principais comportamentos que indicam que o ouvinte está acompanhando, entendendo e concordando com o que está sendo dito.  Este comportamento geralmente é apresentado periodicamente durante as pausas da falante ou quando esse olha para o ouvinte.
- Emitir vocalizações curtas em reação ao que está ouvindo. Por exemplo, o ouvinte emite grunhidos e exclamações que indicam que ele está acompanhando o que está sendo dito e informam como está reagindo ao que está sendo dito.
- Inclinar o tronco na direção do interlocutor (quando estiver sentado). Quando está sentado, tronco do bom ouvinte deve ser ligeiramente inclinado na direção do interlocutor (inclinado para frente ou para a lateral quando o ouvinte está ao lado ou na frente deste, respectivamente).
- Evitar dar atenção para outros eventos que estão ocorrendo no ambiente. Por exemplo, não ficamos olhando demais para as outras pessoas que estão passando próximo do local onde estamos conversando. Quando algo absorve a nossa atenção, nos concentramos a tal ponto que deixamos de prestar atenção a outros fatos e acontecimentos presentes.
- Mostrar empatia. Por exemplo, apresentar expressões faciais condizentes com as emoções que o interlocutor expressando ou que sejam reações naturais ao que ele está relatando. Se ele relata algo amedrontador ou dolorido, mostrar expressões de medo e de dor, respectivamente.

A comunicação verbal do ouvinte ativo

O ouvinte ativo faz pequenas intervenções verbais que contribuem fortemente para motivar, direcionar e fornecer feedback para o falante. As principais destas intervenções são as seguintes.
- Repetir com um tom de interrogação palavras chaves, frases e ideias apresentadas sintéticamente pelo falante para estimulá-lo a expandi-las, corrigi-las ou aperfeiçoá-las (Fazer perguntas e pedir  explicações tem efeitos similares à repetição). Por exemplo, o falante diz: “Ontem peguei o maior congestionamento quando cheguei da viagem.” O ouvinte diz “Viagem?”.
- Ajudar o falante a elaborar o que está dizendo:
- Pedir esclarecimentos de pontos obscuros. Não entender o que está sendo dito provoca a perda do envolvimento com a conversa, impossibilita reações corretas ao que foi dito e causa embaraços. Pedir esclarecimento também é um sinal de interesse e um sinal que deseja continuar ouvindo.  Por exemplo, diga: “Não entendi”; “Explique melhor isso”, “Dê um exemplo”.
- Pedir mais detalhes sobre o que foi dito. Por exemplo, diga: “fale um pouco mais sobre este fato”.
- Pedir esclarecimentos sobre os pressupostos do que foi dito. Por exemplo, diga, “O que você está supondo para fazer este raciocino” ou “Você tem outras hipóteses para explicar este fato?”
- Sintetizar o que ouviu. Por exemplo, dizer“Pelo que entendi, você chegou à conclusão que o melhor é mudar de emprego”.
- Mostra empatia pelo ponto de vista do falante e pelas suas emoções. Uma maneira de fazer isso é refletir os sentimentos do falante. Por exemplo, faça comentários do tipo: “Isto deve ser muito chato para você.”, “Parece que você ficou muito contente com esta notícia”, “Você deve estar feliz com isso.”
- Usar palavras de compreensão que não indiquem a aprovação ao conteúdo do que está sendo dito e usar um tom positivo de voz. Por exemplo, dizer: “Vejo que você está muito convencido desta ideia”, “Parece que você ainda não se decidiu”.
- Resumir as principais ideias e conceitos. “ Você está em um dilema: ficar em um emprego que paga melhor ou ir para um emprego que paga menos mas que você gosta mais.” É muito motivador para o falante ouvir um resumo do que ele disse. Esse resumo indica que o ouvinte estava motivado para ouvir, que prestou atenção, entendeu e quer continuar a conversar.
- Encorajar o interlocutor para compartilhar suas ideias. Por exemplo, “Você não parece muito contente hoje. Algum problema?”
- Perguntar. Fazer perguntas abertas (perguntas que não permitem um simples “sim” ou “não” como resposta).
- Fazer pequenos comentários. Apresentar pequenos comentários para mostrar que está ouvindo (“Que terrível!”, “Não diga!”, “Não sei como você suportou isso!”, “Não acredito!” “Puxa!”,“Hummmmm”, “Ééé”).
- Não contestar imediatamente. Quem contesta imediatamente ou não ouviu, não assimilou, não queria ouvir aquilo ou estava preparando a resposta enquanto o outro falava.
- Não apertar os “botões quentes”. Não tocar em pontos que sabidamente vão causar fortes reações emocionais no falante e desviá-lo do que está relatando.
- Procurar entender as coisas do ponto de vista do interlocutor.
- Certificar-se se entendeu bem. Por exemplo, perguntar: “Estou entendendo isso e aquilo. É isso mesmo?”.
- Não interromper demais o interlocutor. Interromper demais significa que o que você tem a dizer é mais importante do que ele está dizendo.

Sinais que ouviu e elaborou

Quando aquele que ouviu faz algum tipo de intervenção que só é possível para quem captou e entendeu uma comunicação, isso mostra de maneira convincente que realmente a captou e elaborou o que captou. Por exemplo, um comentário pertinente ou uma mudança no modo de agir na direção daquilo que o interlocutor apontou indica com segurança que a comunicação foi recebida e elaborada por quem a recebeu.

Ouvir de verdade

Usar técnicas para ouvir ativamente tem três inconvenientes: (1) exige esforço para prestar atenção a algo que, em si, não desperta atenção e para representar aquilo que as técnicas exigem. (2) Uma vez que o ouvinte comece a simular ou a fingir interesse, ai aumenta a chance do interesse não aparecer. O esforço pode ficar muito desconfortável e esse desconforto atrapalha a apreciação de coisas agradáveis que venham a ser comunicadas pelo interlocutor e (3) o esforço tolhe a criatividade. Em geral quem esta esforçando só produz o mínimo para atender os requisitos. Quem está se comportando naturalmente maximiza a sua criatividade.
Às vezes, vale a pena usar técnicas para ouvir ativamente mesmo quando há pouco interesse no que está sendo dito. Por exemplo, isso dá chances para o envolvimento naquilo que o outro está dizendo. É como esforçar-se para ler as primeiras páginas de um livro que não é imediatamente interessante. Existe a possibilidade de que depois ele se torne interessante.

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