Você fala mais do que deve ou ouve mais do que gostaria?Modere o quanto você fala pelas reações do seu ouvinte.



Monopolizar ou recusar os papéis de ouvinte ou de falante pode gerar uma conversa assimétrica, pouco interessante e insatisfatória. Mais grave ainda é monopolizar esses papéis e desempenhá-los insatisfatoriamente.
Por definição, para que um relacionamento possa ser classificado como “conversa” é necessário que haja alternância entre os interlocutores na ocupação dos papéis de ouvinte e falante. Caso isto não aconteça, não se trata de uma conversa, mas, sim, de um monólogo, de uma palestra, de uma declaração ou algo do gênero.
A falha na alternância desses papéis pode ocorrer quando os interlocutores permanecem na conversa, mas um deles, ou ambos, não abrem mão do papel de falante ou de ouvinte e essa recusa não é confortável para pelo menos um deles. O primeiro desses casos é mais conhecido (“pessoas que falam demais”) do que o segundo (“pessoas que falam de menos”).

Critérios para definir “falar demais” ou “falar de menos”

A quantidade de fala é considera insuficiente ou excessiva quando a sua duração incomoda quem fala ou os seus interlocutores.
Existem bons falantes que podem manter a palavra por muito tempo, até mesmo durante a maior parte da conversa, sem que isso seja desagradável para eles próprios ou para seus interlocutores. Também existem ouvintes altamente estimulantes, que podem permanecer neste papel por muito tempo e essa permanência ser considerada adequada e prazerosa por seus interlocutores e por eles próprios. Muitas vezes, o tempo de fala ou de escuta que é desejável para um interlocutor pode não o ser para o outro.
Portanto, o principal critério para afirmar que uma pessoa está falando demais ou de menos não é o tempo que ela passa ouvindo ou falando, mas, sim, se esse tempo é desejado ou indesejado por ela e pelos seus interlocutores.

Inconvenientes do falar demais e do falar de menos

Como falar demais impediu o início de um namoro.
O paciente relatou que logo nos primeiros momentos do primeiro encontro, ele viu que não seria possível namorar Anne:
“Vi que não seria possível falar com aquela mulher. Assim que nos encontramos, ela disparou a falar. Falou por vinte minutos, quase sem tomar fôlego. Eu simplesmente emiti alguns raros monossílabos e assenti com a cabeça de vez em quando. O que era pior ainda, é que ela só falava coisas negativas”.

Consequências para o ouvinte impostas pelo interlocutor que fala demais

Quem fala demais pode pressionar o ouvinte a desempenhar um papel que ele não quer desempenhar: funcionar como ouvinte passivo ou, pior ainda, fingir que é ouvinte ativo para obter consequências positivas ou evitar consequências negativas.
                  Falar demais anula o ouvinte e impõe-lhe um conflito: ou suporta aquele falante desagradável ou age de uma maneira rude, mas eficaz, para interrompê-lo. Muitas vezes, o ouvinte fica com vontade de sair correndo. Ouvir um falante assim é como assistir um filme ruim: o espectador não participa das filmagens, paga para ver e fica suportando, por um bom tempo, a projeção porque teme decepcionar os seus participantes ou tem a esperança de que o filme melhore. Ouvir alguém assim ainda é pior do que assistir ao filme ruim porque, neste último caso, é mais fácil sair da sala.

Consequências para o ouvinte impostas pelo interlocutor que fala de menos

Quando uma pessoa é lacônica, ela pode tirar a vitalidade da conversa. Se for importante para o seu interlocutor manter a conversa e torná-la animada, ele pode assumir a responsabilidade de animá-la. Isso poderá implicar em um grande esforço para ele e em uma diminuição do seu prazer de conversar.

Medidas para não falar demais

                  Três medidas são sugeridas pela literatura dessa área para aqueles que querem evitar falar demais:
(1) Sempre falar pouco
(2) Falar no máximo por cinco minutos e passar a palavra
(3) Deixar-se monitorar pelas próprias motivações e percepções e pelos sinais apresentados pelo interlocutor que indicam se você pode continuar no papel de falante, se deve continuar a desenvolver um determinado tema e quais dos seus aspectos devem ser desenvolvidos.
As duas primeiras medidas são fórmulas cegas que não atendem a muitas situações. A terceira dessas medidas é “inteligente” porque é flexível e atende o que está ocorrendo em cada momento do diálogo. Por isso, vamos desenvolvê-la aqui.
As duas primeiras medidas mencionadas acima podem ser inconvenientes em muitas situações. Elas sugerem apenas a inibição da quantidade de fala. O falante, ao tomar essas duas medidas, não se deixa guiar pelas motivações e inibições despertadas por cada tema e por cada momento da conversa. Talvez elas contribuam positivamente apenas para aqueles que costumam falar demais em todas as situações. A terceira dessas medidas é melhor que as duas anteriores. Essa terceira medida ajusta a quantidade de fala às próprias motivações e às pistas que indicam como aquilo que está sendo dito está afetando os interlocutores.

Monitoramento da fala pelas próprias motivações e percepções.

O bom falante sente prazer ou, pelo menos, acha importante o que está dizendo. Por isso, é importante ficar atento para às próprias motivações para escolher, abordar e calibrar quanto e como gostaria de abordar um dado tema. É importante, também, estar atento para as próprias motivações para permanecer no papel de falante ou de ouvinte.

Administrar a fala pelas reações do interlocutor

Deixar-se monitorar pelas reações do interlocutor para escolher temas da conversa, por quanto tempo e como abordá-los.  Uma maneira de fazer isso é mencionar temas, tópicos e informações e verificar se o interlocutor apresenta sinais de interesse por eles. Caso sim, falar um pouco daquilo o interlocutor mostrou interesse e observar se ele apresenta novos sinais que indicam quer mais informações. Neste caso, fornecê-las brevemente e esperar novos sinais de interesse. E assim por diante. Esse procedimento permite a calibragem contínua de informações de acordo com as necessidades do ouvinte.

O silêncio do interlocutor pode não ser um sinal para o outro falar
Geralmente é errado interpretar o silêncio ou os sinais fracos de interesse do interlocutor como uma autorização ou convite para iniciar a fala ou falar mais sobre o que já está falando.  A debilidade desses sinais pode indicar que eles estão sendo apresentados apenas por educação. Por exemplo, certa vez presenciei uma pessoa que estava em uma fila de votação muito demorada “alugar” os ouvidos de uma segunda pessoa que apresentava sinais mínimos de interesse, mas que foram considerados suficientes pela primeira pessoa para tagarelar infindavelmente. Assim que o falante compulsivo deu uma saída por uns breves momentos, o ouvinte torturado comentou: “Não estou aguentando mais esse cara falando! Não sei o que fazer: desistir da votação, chamar o guarda ou ser rude com ele e pedir para calar-se?”.

Quando uma pessoa fala demais porque o seu ouvinte está dando sinais errados para ela continuar a falar

Os interlocutores dispõem de uma grande quantidade de sinais que são uteis para regular o fluxo da fala. Esses sinais geralmente são não verbais e equivalem às mensagens verbais como as seguintes: “Continue no papel de falante”, “Fale mais sobre esse assunto”, “Estou acompanhando o que você está dizendo”, “Estou envolvido na conversa”, “Não estou mais interessado neste assunto”, “Quero falar. Passe-me a palavra”, “Não quero a palavra. Continue como falante”, “Terminei de falar. Fale você agora”.
Essas mensagens servem para regular o fluxo da fala e, por isso, receberam o nome de “reguladoras”. Elas funcionam de maneira parecida com os sinais de trânsito que servem para regular o fluxo de veículos.
Muitas vezes, aquilo que um ouvinte está sinalizando para o falante não condiz com a sua motivação em relação à conversa e ao tema que está sendo tratado, mas sim com a sua motivação para agradar ou desagradar o interlocutor, para passar certa imagem, para evitar ser rude, etc. Nesses casos, o ouvinte pode apresentar sinais errados que autorizam, aprovam e solicitam que o outro continue a falar. 

Sinais que estimulam a fala

Vamos apresentar aqui alguns sinais que estimulam o interlocutor a continuar a falar. Para desestimulá-lo, basta ir eliminando ou atenuando esses sinais.
Alguns falantes compulsivos falam até sozinhos. Mas, geralmente as pessoas comuns deixam de falar quando são desestimuladas pela ausência de sinais que lhes deem permissão para continuar a falar.
- Orientar a frente do corpo (olhos, rosto, peito, pélvis, joelhos e pés) na direção do falante.
- Não prestar atenção em mais nada que esteja ocorrendo no ambiente (deixar de olhar para os passantes, deixar de ouvir a conversa na mesa ao lado, etc.)
- largar totalmente outras atividades (desligar o computador, fechar o livro que estava lendo)
- Anuir frequentemente com movimentos de cabeça em reação ao que ou falante está dizendo.
- Acionar as informações gratuitas fornecidas pelo interlocutor (pedir para ele expandir aquelas informações que você não solicitou)
- Perguntar por outros aspectos do assunto que ele está abordando
- Não tomar qualquer iniciativa para mudar de assunto ou encerrar a conversa
- Dar sinais que vai ficar um bom tempo conversando: sentar, fechar a porta, encostar o corpo a uma superfície, depositar em uma mesa o material que você estava carregando, etc.
- Declarar que tem tempo para conversar
Quanto mais sinais e quanto mais intenso é cada um deles, mais interesse na conversa você estará mostrando. Muitas vezes um interlocutor não está incentivando a fala do outro, mas este continua a falar mesmo assim. Neste caso, o que resta é fingir que está dormindo, pedir para o falastrão parar de falar ou retirar-se! 
Modere o quanto você fala pelas reações do seu ouvinte. Caso você não esteja interessado em uma conversa ou assunto, diminua os comportamentos que incentivam a continuidade da fala ou apresente sinais explícitos que deseja terminar o assunto ou conversa. Lembre-se que sempre é aconselhável manter a polidez para não ofender os seus interlocutores.

Um comentário:

Ailton Amelio da Silva disse...

Favor solicitar permissão do UOL para repruzir esse artigo e citar seu autor:

Dr AILTON AMÉLIO DA SILVA

site Ciência e Saúde, da UOL

VOCÊS FIZErAM UMA APrOPrIAÇÃO INDÉBITA!!

SUJEITA ÀS PENALIDADES DA LEI